terça-feira, 19 de julho de 2011

NADA DE NOVO NO GALINHEIRO


Chegamos ao máximo da frivolidade em nossa sociedade. Homens e mulheres brasileiros estão muito preocupados porque a seleção de futebol não se classificou para as semifinais da Copa América. Debatem, como se isso fosse vital para todos, se o treinador da seleção deverá continuar treinando a seleção, se o jogador “a” ou o jogador “b” é tudo aquilo que a mídia diz e o que deverá ser feito para que a seleção de futebol volte a vencer, para alívio dos corações canarinhos.

     É o máximo da frivolidade. É como se todo o resto estivesse perfeito no Brasil, com exceção do futebol. Pessoas esbravejam, colunistas de futebol colunizam a sua indignação, mesas redondas são formadas para que se verifique, talvez através de uma comissão parlamentar mista de inquérito, formada por aqueles ilibados senhores que nos representam na Câmara e no Senado, o que houve de errado com a seleção de futebol. Socialites cobrem a boca com a mão e exclamam: “mas quem diria?!”

     Dilma Roussef perde o sono, a Bolsa de Valores despenca, os estudantes não mais estudam, os trabalhadores esquecem de trabalhar, todos os segmentos sociais estão aparvalhados porque perdemos para o Paraguai. Logo o Paraguai! E nos pênaltis! Será que ninguém sabe chutar bolas da marca de pênalti neste Brasil? Ora, bolas! Os jogadores supervalorizados que desejam logo ser vendidos para o exterior temem que o valor dos seus passes diminua drasticamente, empresários de futebol pensam na possibilidade do suicídio, nos quartéis as marchas forçadas não são tão forçadas porque os sargentos caem em súbita inércia e os soldados jazem em profunda tristeza, aventa-se a possibilidade de um duro golpe militar no futebol e os mais radicais desejam raspar os cabelos do Neymar.

     A mídia minimiza o drama. Diz que ganhar ou perder a Copa América tanto faz, que tudo o que falaram antes deve ser tomado como força de expressão, que o que importa é o campeonato brasileiro – a verdadeira guerra para a qual todo o povo deverá estar atento – e que perder ou ganhar é quase a mesma coisa em se tratando de América do Sul, porque bonito mesmo é a América do Norte. Insistem que a culpa não é do penteado do Neymar ou do cabeleireiro do Neymar, que lembra um pica-pau, ou um galinho, dependendo da preferência e do ponto de vista e que, além disso, o fato de termos um ganso e um pato no time nada significa e não traz mau agouro. O que queria o povo? Um pavão? Ou, quem sabe, um quero-quero, que é mais afeito aos gramados? Que ninguém se preocupe, porque foi apenas um acidente de percurso e o Brasil continua sendo o país do futebol, mas apenas o país do futebol, o que se pode fazer?

     A mídia luta pelo seu ganha-pão e lembra que deveremos ter um grande time e vencer as Olimpíadas de Londres, em 2012, mesmo que seja o ano do fim do mundo, mas o que importa? E se não vencermos em 2012 – o que é uma Olimpíada, senão um evento menor? – com certeza venceremos a Copa do Mundo, em 2014.

     Essa ninguém nos tira! Afinal, vai ser no Brasil e nós é que vamos dar um Maracanaço neles! De um jeito ou de outro! De preferência, de outro. Vejam o que a Dilma já está fazendo, desde agora, com o caso das licitações que poderão ou não ser licitações. Tudo de acordo com o jeitinho brasileiro. Se for necessário gastarmos alguns bilhões a mais para que a seleção vença, gastaremos. Não temos o dinheiro do pré-sal do Sérgio Cabral? Não atraímos todas as multinacionais para devastarem o nosso pais quase gratuitamente?

     Alguma coisa temos que ter de volta e essa alguma coisa tem que ser a Copa do Mundo. Que todos entendam desde agora – construiremos estradas, aeroportos, afastaremos as favelas para bem longe, mataremos todos os suspeitos de serem suspeitos, entregaremos a Amazônia e faremos até um trem-bala, mas a Copa do Mundo tem que ser nossa! Os outros países participantes que saibam desde já que serão apenas coadjuvantes em 2014. Mesmo que o mundo tenha acabado antes, seremos hexa-campeões, porque é só isso que o povo brasileiro deseja: o hexa. E se o povo tiver o hexa aceitará qualquer outra coisa sem resmungar.

     Frivolidade? Ai dos frívolos que pensarem assim! É uma questão de política, de estratégia bem organizada a médio prazo, da busca da perfeição no trato do poder, da sublime arte da manipulação das massas. E quem for contra que se mude. “Brasil – ame-o ou deixe-o!”.

Um comentário:

  1. Assisti parte da Copa América, e continuo a pensar que o Brasil já foi o país do futebol. Bons tempos aqueles, em que havia "amor à camiseta", e não esse comércio ligado à interesses midiáticos, em que os interesses financeiros estão acima de tudo e todos. Interessante análise!
    Lidia.

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