quinta-feira, 16 de agosto de 2012

MILAGRES




Carolina voltou! Depois de 25 dias de tristeza e sensação de vazio aqui em casa, quando Fidel, o nosso outro gato, adoeceu – provavelmente de saudades – e já tentávamos nos acostumar à ausência, mas sem aceitá-la, duas noites atrás ouvi um miado que mais parecia uma queixa. Fidel correu para a porta e eu corri para a sacada, de onde enxerguei Carolina. Chamei Lidia e, quando saímos já não vimos mais Carolina.

     Procurei por toda a quadra e voltei imaginando até a possibilidade de uma aparição, de uma ilusão de ótica, de uma vontade corporificada por breves instantes, porque, naquele momento em que ouvi o miado estranho eu estava pensando em Carolina. Continuei pensando: e se era ela? Não me contive e voltei à sacada. Eram quase cinco horas da manhã do inesquecível dia 14 de agosto. A rua estava calma, o tempo pesado, prenunciando chuva; na calçada somente outro gato conhecido, muito bonito, branquinho, que costuma brincar com Fidel quando dorme na soleira da nossa porta e Fidel desce as escadas, estende uma mãozinha por baixo da porta para cumprimentar o amigo e com ele troca miados cúmplices.

     Chamei Lidia até a sacada, sob o pretexto de ouvir os passarinhos que já se alvoroçavam nas árvores em frente, ver o gatinho amigo dormindo junto à nossa porta, conversarmos sobre a possibilidade... Talvez... Olhei para a esquina e vi um gato preto! Lidia saiu correndo; fui atrás com a lanterna. Era Carolina! Fugiu por instinto quando ouviu os nossos gritos e Lidia viu quando ela entrou por entre as grades de um porão. Chamamos, clamamos, e, aos poucos ela veio vindo, com um miado quase choroso. Quando se aproximou mais, consegui puxá-la através das grades do porão. Estava magra, desfigurada, mas viva.

     Ainda estamos em estado de graça.

     Depois de alguns dias do sumiço de Carolina, Fidel começou a chorar pelos cantos, a pedir colo a toda hora, a emagrecer até pegar um resfriado e necessitar de cuidados extras. Eu dizia a ele que Carolina estava viajando, mas que logo voltaria e, se não voltasse em seguida, chegaria o dia em que todos faríamos a mesma viagem e a encontraríamos em algum lugar do cosmos ou em uma dimensão somente intuída. Mas voltaríamos a ficar juntos. Fidel fingia acreditar, mas logo voltava à sua tristeza.

     Ao ver Carolina de volta, ele a cheirou, lambeu, deu aqueles beijinhos especiais, correu à volta, mas percebeu que Carolina ainda estava fraca para as brincadeiras que costumavam fazer. Ainda está fraca, dorme bastante e toma vitaminas. Junto com Fidel. Aos poucos ela vai se recuperar, assim como nós, que passamos aquele tempo todo como se fosse uma grande noite em que o mesmo pesadelo comum se repetia com nuances diferentes.

     Quanto ao seu desaparecimento, as dúvidas continuam. Ela estava fechada no escritório que dá para a nossa sacada. Ali ela pode ficar à vontade, de noite. No dia seguinte tinha sumido. Quando a encontramos, estava com as duas patinhas traseiras esfoladas no mesmo lugar. Cordas? Mordidas? Teria ficado presa em algum lugar distante? Logo após ela  sumir eu vasculhei toda a zona, todos os buracos, perguntei para toda a vizinhança. Nem miado. Onde estava? Aproximou-se na última semana, quando a encontramos naquele porão - arisca, faminta, machucada. 

     Agora, estou acreditando ainda mais em milagres. Poucos dias antes de Carolina voltar, as meninas do vôlei conseguiram vencer o time dos Estados Unidos em uma final apoteótica, nas Olimpíadas. Foi o primeiro claro sinal de que é possível reverter situações que parecem perdidas. Até no Brasil, por incrível que pareça!

     Tento acreditar na possibilidade de milagres, como a proibição das obras da maléfica usina hidrelétrica de Belo Monte, na prisão dos culpados pelo Mensalão – embora tudo indique o contrário. E até procuro imaginar o nosso país livre da cotidiana corrupção. Por momentos, penso na possibilidade dos candidatos desta próxima eleição, os que forem eleitos, realmente cumprirem as suas promessas de campanha.

     É um momento de euforia e, nesses momentos, a gente pensa e age com demasiado otimismo. É preciso ter um certo cuidado. Ontem mesmo a Dilma continuou a entregar o Brasil para o capital estrangeiro. Entregou rodovias e ferrovias que serão construídas e sofrerão pedágio. Talvez haja pedágio até dentro das grandes cidades. Prepare o seu bolso e lembre-se que a liberdade de ir e vir pode ser apenas uma alegre mentira. Uma mentira para épocas de eleições, como agora. Você já escolheu candidatos? Tome cuidado, porque os adversários de hoje serão os aliados de amanhã.

     Cuide daqueles que realmente amam você. Cuide do amor da sua vida, das suas plantas, dos seus bichinhos. Neste momento de bandeiras, foguetes, gritos, promessas, entrevistas, debates, palavras mansas e muitos sorrisos – desconfie. É o momento em que o Estado aparece como grande amigo dos cidadãos, através dos seus representantes, na maioria usando máscaras reptilianas. Lembre-se que o Estado somos nós, a grande maioria de quem é esmolado o voto, e não eles, os forjadores de emoções. Acautele-se.

     Mas continue acreditando: milagres podem acontecer. Afinal, Carolina voltou!

Um comentário:

  1. Milagre! Palavra mágica. No caso de Carolina, um exemplo. Concordo com o blogueiro. Também gostaria que outros milagres acontecessem para o bem comum em nosso país, e quem sabe no planeta terra?
    Lidia.

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