segunda-feira, 20 de maio de 2013

A GUERRA SECRETA (4) – O CENTRO DO PODER



Curioso o fato de Saint-Germain, que se dizia conde, ter nascido na Transilvânia. Assim como Drácula, nunca foi visto comendo ou bebendo e também era imortal, com a diferença de que a personagem de Bram Stocker somente foi morta depois de muito trabalho, enquanto Saint-Germain teria morrido oficialmente em 1784.

   Após o convento de Wilhemsbad, muitos daqueles senhores que desfrutavam de títulos nobiliárquicos aderiram aos Illuminati, incluindo Saint-Germain, Cagliostro e Ferdinand, duque de Brunswick - o grande chefe da maçonaria europeia, já devidamente templária e orgulhosa dos seus graus superiores que a tornavam “escocesa”. Com a lenda de Hiram – que refletia a morte de Jacques de Molay – e toda uma tradição a revesti-la, a maçonaria ressurgia como uma extensão do Judaísmo, bem mais atraente que a simplicidade estóica do Cristianismo.

   Também por isso, os maçons construiram belos lugares de encontro e iniciação à imagem do templo de Salomão (que deveria ser chamado Templo de Davi, porque, afinal, foi o pai de Salomão quem recebeu o modelo da construção do próprio deus judeu) e deixaram de se reunir em tavernas como “O Ganso e a Grelha” ou “O Bode”, que não primavam pelo simbolismo em seus nomes. Talvez “O Bode”, lembrando a figura hierática do Baphometh, mas, sinceramente, “O Ganso e a Grelha”...

   A exemplo das cidades-estado da Grécia e de Roma, quando os reis foram substituídos pela aristocracia, perdendo o poder de reger e ficando limitados aos cultos sacros, considerou-se muito moderno durante o período do Iluminismo destituir-se a monarquia do seu despotismo feudal e entregar os reinos para os seus verdadeiros donos que, naturalmente, formavam a classe dos muito ricos e eram apelidados de burgueses porque se originaram nos burgos, lugarejos que cercavam mosteiros e castelos medievais e, posteriormente, se transformaram em cidades.

    Não havia interesse em derrubar os monarcas, mas torná-los obedientes servos bem remunerados para, em dias e horas aprazadas, abanarem para o povo, que veria neles o reflexo de Deus na Terra e se sentiria agradecido por tão augusta proteção. Chegara o momento de tornar os déspotas tradicionais esclarecidos com a luz da razão, passando a outros déspotas sem coroa o pastoreio dos povos - déspotas muito simpáticos que avisavam aos trabalhadores que continuariam trabalhando como escravos, muitas vezes fazendo bolos quanto faltasse pão; no entanto, agora tinham direitos humanos, muito humanos.

   No século das luzes, o capitalismo surgia como o novo grande déspota e as massas, que ainda não se sabiam massas, estavam extasiadas pela sucessão das brilhantes descobertas e a maior de todas – a utilização da eletricidade – ainda restrita à pesquisa nas oficinas maçônicas e conventos jesuítas - decifrava os códigos de Deus e prometia séculos vindouros de imenso glamour.

   Durante a Revolução Francesa matava-se. Não era a ideia inicial, quando se pretendia apenas o apoio de Luís XVI para a reforma social que elevaria burgueses a barões do reino, mas que fazer com um rei que adorava brincar de ferralheiro e com uma rainha estrangeira sujeita a sucessivos escândalos?

   Além disso, o povo enraivecido, os sans-cullote que acreditavam fazer a revolução assaltando castelos e a Bastilha, símbolo do feudalismo que se extinguia e onde estavam dois ou três prisioneiros, incluindo o Marquês de Sade, exigia cabeças, deliciando-se com o espetáculo da guilhotina. Acreditava o povo que logo após a mortandade de clérigos, nobres e monarquistas lhe seria dada a prometida Igualdade, a ansiada Fraternidade e a desconhecida Liberdade. Deram-lhe um falso imperador, inúmeras batalhas e o papel de bobo da História que era urdida nos bastidores.

   Entre os Illuminati, Goethe usava o pseudônimo de Abaris, Mirabeau o de Leonidas e Adam Weishaupt o de Spartacus. Cada Illuminati tinha o seu pseudônimo ou nome esotérico, hábito que se estendeu para a maçonaria e demais organizações que se imaginavam muito secretas e em contato com o invisível que, obrigatoriamente, deveria ser mais sábio que o visível e cedo ou tarde passaria grandes revelações aos “homens de desejo”, conforme denominava Saint-Martin àqueles que liam os seus escritos - que não eram seus, mas ditados pelos Superiores Desconhecidos. Os martinistas, ao contrário dos maçons, acreditavam na iniciação individual e em práticas mágicas que levariam, cedo ou tarde, a um contato mais concreto com a Coisa (le Chose) ou “Restaurador”.

   A verdadeira restauração aconteceu com o reinado de Luís XVIII, em abril de 1814 - o faceiro rei resignado às demais potências europeias, após a traição de Grouchy em Waterloo. Mas, antes de todas as batalhas, quando a república da guilhotina era um autêntico reflexo da deslumbrada era da razão, os templários maçons caçaram martinistas cristãos, que se viram obrigados a fugir para a Suíça e outros cantões, levando consigo o que restou dos cadernos iniciáticos de Saint-Martin. Voltaram quando o século da luzes se apagava em sangue coagulado e muito havia o que fazer para enterrar os mortos e invocar os recalcitrantes espíritos.

   Definiam-se duas vertentes dentro do ocultismo. Martinistas e rosacruzes continuadores dos ensinamentos de Pasqualy - o mestre que teria ou não morrido em São Domingos - buscavam a “verdade” através do misticismo. Praticavam artes mágicas que incluíam círculos onde o operador ficava com a sua espada desembainhada a afastar maus espíritos e conjurando os bons que tinham nomes que terminavam, inevitavelmente, com o sufixo “el”; mantras eram entoados; riscavam-se pantáculos que se pareciam muito com os desenhos que os pretos velhos fazem nas terreiras e que teriam sua origem nas descobertas do iniciado Salomão, provavelmente quando se interessou por cabalas outras, desobedecendo a Jeová e do seu reino foram-lhe tiradas dez tribos. A magia virou uma obsessão e tantas eram as práticas que se eu fosse contar não poderia e não saberia, porque eram muito, muito secretas.

   Por seu lado, os maçons – devidamente infiltrados pelos Illuminati, prováveis jesuítas disfarçados de iluministas – não desdenhavam nenhuma das cores da magia e a ela agregavam a ciência material, que prometia grandes ganhos a prazo ainda indeterminado e transformava os magos da razão em semideuses, quem sabe verdadeiros deuses que criavam o seu arquétipo em um Grande Arquiteto Universal, o perfeito Geômetra que usa a newtoniana régua e o compasso da Gnosis para desvelar, somente para os iniciados, o poder Gerador do capital.

    Em sua misteriosa pureza-impureza tão própria dos mercadores de todas as épocas, os maçons franceses, agora não mais ateus depois da revolução que elevara a burguesia a casta privilegiada, a cada três batidas do simbólico martelo da justiça lembravam o deus que tudo criara, muito parecido com o Jeová hebraico e cuja verdadeira denominação seria esclarecida no século XIX pelo judeu estadunidense Albert Pike, o grande Superior Conhecido que se preparava para a reencarnação na América muito ao norte, que dizimava os seus últimos nativos.

  O nome de Deus é Adonai ou Lúcifer?, perguntavam-se os angustiados maçons-Illuminati, e Pike, o senhor de todas as esferas e triângulos decidiria: - Lúcifer! Adonai era o deus mau, o Demiurgo que deveria ser combatido. Lúcifer, o anjo da luz, trazia o segredo da ciência que daria ao povo escolhido a suprema luz nuclear e o domínio sobre a natureza e a humanidade profana. Lúcifer e Adonai passavam a ser os deuses maçônicos. “Sim, Lúcifer é Deus, e, portanto, Adonai também” – escreveria Pike. “Assim, a verdadeira e pura religião filosófica é a crença em Lúcifer, assim como em Adonai”.

   Enquanto esperavam a vinda do guru luciferiano, questões transcendentais como essa eram tratadas nas Lojas dos Estados Unidos da América, desde que fora transferido para Charleston o centro mundial do poder oculto, deixando os esfuziantes franceses com uma revolução perdida e a sensação de logro presa nos milimétricos aventais.

   Na França, o britânico Ramsay fizera um discurso, afirmando que os maçons eram descendentes diretos dos templários, cavaleiros que foram tão cruelmente derrotados por árabes e mamelucos nas antigas Cruzadas e, mesmo assim, arrecadaram imensas riquezas em todo o continente europeu e sabe-se mais aonde, até o momento em que um rei muito mau, chamado Filipe, o Belo – que deveria ser feio, muito feio!... Mas era melhor lembrar que o poder secreto dos templários, um poder muito desconhecido, somente acessível aos grandes adeptos, era uma herança para ser ritualizada em mais 30 graus – e nunca esquecer que Jacques de Molay, assim como Hiram Abiff, deveria ser vingado.

   Em Charleston, onde passa o Paralelo 33 norte, em 1761 o Conselho dos Imperadores do Oriente e do Ocidente outorgou uma carta-patente para um senhor chamado Stephen Morin, constituindo-o Grande Inspetor do Rito da Perfeição. Era a instituição do Rito Escocês Antigo e Aceito, com 33 graus, que, embora tenha sido criado aparentemente a partir do discurso de Ramsay, segundo o mago Leadbeater foi estabelecido primeiro nos Estados Unidos.

   Tristemente, Leadbeater afirmou – em “O Rito Escocês Antigo e Aceito” (www.samauma.biz) - que “Stephen Morin foi também infeliz na escolha dos seus lugares-tenentes, pois em muitos casos eram judeus de reputação não muito boa, e é por meio dessas mãos algo sujas que temos de investigar o Rito de Perfeição durante os quarenta anos subsequentes. O Rito atravessou um período de obscurecimento, quando os graus eram vergonhosamente vendidos a quem quer que comprasse os seus títulos, ao passo que o significado interno das cerimônias foi quase esquecido”.

   Narra o desencantado Leadbeater que o Rito foi estabelecido em Charleston por Stephen Morin, mas, a partir de 1783, houve uma sucessão de judeus, durante quarenta anos, como deputados-inspetores do Rito: Moisés Cohen, Isac Long, Moisés Hayes, Isac da Costa... até o Rito tornar-se perfeitamente perfeito, como cabe a um rito de perfeição, podendo, então, passar para mãos profanas com luvas de iniciados.

   Para dar maior ênfase à maçonaria “escocesa” norte-americana que dominaria o mundo visível através de (quase) invisíveis manobras, alegou-se que Frederico II,  o muito alegre soberano da Prússia, teria ratificado as leis que regulam o Rito Escocês, constituindo pessoalmente o grau 33 e delegando poderes, como Soberano da Maçonaria, a nove maçons em cada país.

    No mesmo texto, Leadbeater refuta a versão sobre Frederico II, dizendo: “(...) a verdade é que Frederico II não tomou nenhuma parte ativa no Rito de Perfeição; jamais ratificou a Constituição nem criou o 33º (...)”. No entanto, “(...)Em 1785, um ano antes da morte do rei, encontramos uma carta endereçada a Frederico por um tal Salomão Bush (judeu, com certeza), Deputado Grande-Inspetor da América do Norte, pedindo-lhe o reconhecimento de uma Loja que ele tinha consagrado (...)”. A maçonaria amesquinhava-se depois das revoluções francesa e estadunidense, buscando um soberano secreto para os donos de um país que se dizia republicano e se preparava para tonar-se imperialista, provavelmente com o apoio do combatido Demiurgo.

  Alguns anos antes da gloriosa revolução dos franceses, o Príncipe-Eleitor, conde palatino e duque da Baviera Karl Theodor aprovou o edito que levou os Illuminati a sua oficial dissolução em 1784, depois da descoberta de documentos da ordem que tratavam de planos secretos para dominar a maçonaria e destruir a Igreja Católica através dos mesmos métodos usados pelos jesuítas. Adam Weishaupt, filho do rabino Johann Georg Weishaupt, retirou-se para um aparente exílio em Regensbourg, passando a liderança para Joachin Bode que, em 1787, junto com o núcleo francês, constituiu a ordem secreta “Philadelphes”. Oficialmente, os Illuminati estavam banidos da Europa e foram muito bem aceitos nas Lojas dos Estados Unidos.

    No mesmo ano da extinção dos Iluminati – 1784 – o imortal Saint-Germain também morria em Schleswig-Holstein, propriedade do Illuminati Karl de Hesse-Kassel; os maçons estadunidenses entravam para todas as igrejas protestantes disponíveis, a exemplo dos maçons europeus; o Congresso dos Estados Unidos ratificava oficialmente o Tratado de Paris de 1783 com a Grã-Bretanha e os dois países irmãos preparavam-se para colonizar o mundo, sendo que os mercadores dos Estados Unidos já estavam presentes nos portos da Ásia e da África.

    Em 1784, a extinção da Companhia de Jesus ainda era válida para todo o mundo católico, menos Polônia e Rússia, onde dominava a muito iluminada czarina Catarina. Na Prússia, o protestante Frederico II, soberano da maçonaria, também acolhia os jesuítas expulsos dos países amigos.

   Em 1784, o papa Pio VI nomeou o jesuíta John Carrol bispo de Baltimore. John Carrol era muito amigo do maçom Benjamin Franklin e foi devido às pressões deste sobre a Santa Sé – na época, ainda submissa à maçonaria – que Carrol foi nomeado Prefeito Apostólico dos Estados Unidos da América, em 26 de novembro de 1784. Muito ajudou, também, a essa nomeação a influência do irmão do bispo jesuíta, o maçom Charles Carrol de Carrolton, signatário da Declaração de Independência e um dos mais ricos latifundiários dos Estados Unidos.

   A partir do bispo John Carrol (depois arcebispo, com uma arquidiocese contendo 153 paróquias, e quatro condados, incluindo Washington), aos poucos, a Igreja Católica nos Estados Unidos, eivada de “americanismo”, tomou o seu próprio rumo, ignorando as orientações de Roma a ponto de criar o que foi batizado de “Catecismo de Baltimore”.

   Em 1784, 5 anos antes do início da Revolução Burguesa na França, Cagliostro fundou o Rito de Mênfis-Misraim ou Rito da Alta Maçonaria Egípcia, que mais tarde abrigou o espírito revolucionário de Garibaldi e ocultistas famosos como Jean Bricaud e Theodore Reuss. No Brasil e América Latina, os ideais iluministas insuflavam revoltas e revoluções lideradas por maçons. O capitalismo nascente dava-se ares de libertário, mudava os apelidos dos poderosos e se preparava para uma nova era, quando a escravidão seria banida para dar lugar à exploração dos povos e ao colonialismo.


(Continua)

2 comentários:

  1. Excelente texto. Estou vendo que a última postagem foi da série foi feita em 2013. Não vai haver mas continuação?E as fontes, poderia publicar?

    ResponderExcluir
  2. Muito obrigado pelo seu trabalho e pela transmissão de conhecimento, muito obrigado mesmo. Pena não ter continuado até aos dias de hoje. Para os interessados em continuar a pesquisa, aqui fica:

    http://paradigmatrix.net/sociedade/conspiracoes/rothschild/o-golpe-dos-rothschild-na-batalha-de-waterloo/

    http://www.alfredo-braga.pro.br/discussoes/fraudegananciaeusura.html

    Com os melhores cumprimentos,

    ResponderExcluir

Faça o seu comentário aqui.

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...