terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

A LEI DOS HIPÓCRITAS – CONTINUA A PERSEGUIÇÃO AOS MÉDICOS CUBANOS




Ganha repercussão o caso do médico cubano que foi autorizado pela administração municipal a fazer um atendimento dentro do “Pronto Atendimento 24 Horas”, no dia 2 de janeiro, em Candiota (RS), na ausência de médicos brasileiros. O médico plantonista brasileiro não estava de plantão. Ou estava passeando ou cuidando do seu carro ou atendendo outro paciente, fora do estabelecimento. Há várias versões. O fato é que não havia sequer um plantonista naquele momento em que um dos pacientes estava em estado grave, sob risco de morte. 

    Candiota é uma pequena cidade de cerca de dez mil habitantes e têm seis médicos brasileiros contratados, todos eles de outras cidades, como Bagé e Pelotas. Nenhum estava presente no Pronto Atendimento quando o estado do paciente se agravou e a única solução foi chamar o único médico enviado do programa “Mais Médicos” ao município. Devido à urgência, o médico cubano Maikel Ramirez Valle foi chamado e encaminhou o paciente para o pronto-socorro de Bagé, cidade próxima. 

    Ao chegar a Bagé, o médico que recebeu o paciente viu que a requisição de internação não continha o número do registro profissional e fez a denúncia. A situação era tão grave que o paciente veio a falecer. Mesmo assim, a grande preocupação do médico bajeense foi denunciar o colega cubano ao Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers), porque os médicos estrangeiros estão limitados a atender nas Unidades Básicas de Saúde (UBS). 

    O Cremers estendeu a denúncia contra o médico cubano, por exercício ilegal da medicina, à Polícia Federal, ao Ministério Público do Trabalho, ao Ministério da Saúde e ao Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Cimers). Quando da vinda dos médicos cubanos, médicos bajeenses fizeram uma greve simbólica de protesto e não se sabe se isso poderia ter ocasionado alguma piora nas condições de saúde de pacientes que deixaram de ser atendidos. 

    O que se sabe é que aqueles médicos “grevistas” pouco estão ligando para os seus pacientes e muito para os seus salários. O juramento de Hipócrates, no Brasil, não passa de uma promessa e promessas podem ser descumpridas no país da cultura da corrupção. 

    Como conseqüência, e apesar dos esforços do prefeito de Candiota, Luiz Carlos Folador, em defender o médico cubano, que estava apenas cumprindo o seu dever, se acatadas as denúncias Candiota poderá ser descredenciada do programa “Mais Médicos” e o médico cubano impedido de exercer a sua profissão no Brasil. 

    Este é apenas um dos fatos, o mais recente, que revela a perseguição dos médicos estrangeiros – principalmente os cubanos – por médicos brasileiros, desgostosos porque a sua apática e burocrática prática médica, quando se trata de pacientes pobres, está sendo posta em evidência e contraditada pela ação de médicos, como os cubanos, que fazem da medicina um ato de amor. 

    Largamente veiculado foi o caso do médico cubano que teria receitado dipirona em excesso para uma criança, no bairro Viveiros, em Feira de Santana (BA). De acordo com a “Revista Forum” (http://revistaforum.com.br/blog/2013/12/a-historia-do-medico-cubano-sabotado-por-duas-medicas-brasileiras/, que publicou matéria de Kika Castro, o caso foi completamente diferente. 

    Gilmara Santos, a mãe da criança doente, disse à jornalista que foi muito bem atendida pelo médico Isoel Gomes Molina. “Ele me atendeu muito bem. Ele tratou meu filho super bem, porque tem médico que nem olha na cara da mãe e nem da criança. Ele me explicou direitinho como dar o remédio, disse ainda que a quantidade de gotas é definida a partir do peso da criança. Ele prescreveu 40 gotas, mas foi apenas um erro. Ele me disse exatamente o que eu deveria fazer, que era para dar apenas 10 gotas a cada seis horas.” 

    “Eis que, ao ver a receita, outra médica — esta brasileira — “entendeu” que o médico havia sugerido uma dose única de 40 gotas, tirou uma foto da receita médica — que é um documento particular do paciente — e a publicou na internet, em uma rede social. Em seguida, um vereador, chamado José Carneiro (PSL), viu a foto na rede social e resolveu denunciá-la na Câmara Municipal e para a imprensa. Quando perguntado por repórteres, ao que tudo indica, mentiu, dizendo que Gilmara é que o tinha procurado para fazer a denúncia, o que ela negou veementemente.” 

    Na internet choveram críticas aos médicos cubanos e não adiantou o desmentido porque o episódio já havia sido rotulado como “erro médico” e até hoje muita gente acredita que realmente houve um erro médico, provavelmente devido ao fato do médico ser de Cuba, um país socialista. 

   Entrevistada pela Globo (http://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2014/01/falta-amor-diz-cubana-que-completa-um-mes-de-mais-medicos-no-rs.html), a médica cubana Lourdes Richardson Mann, que trabalha em Cristal (RS), cidade que tem cerca de 8 mil habitantes, diz que “O Brasil vive um problema de falta de caridade humana. Falta amor ao próximo”. 

     Lourdes estranha muito a burocracia existente para casos de urgência. Diz que em Cuba não existe isso. “Pedir permissão para internar em caso de urgência? Isso não existe lá. Fiquei sabendo que as pessoas entram na Justiça para conseguir um leito aqui. É um absurdo”. 

   Aos poucos, os médicos estrangeiros estão constatando os absurdos da medicina brasileira. Também em Bagé, um caso recente ficou famoso: uma pessoa ficou em torno de cinco horas esperando em uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA). Sentia dores e o seu caso foi rotulado como não muito grave. E ficou esperando. Ela acredita que o médico (ou a médica) de plantão estaria na internet. 

    A internet é outro grande problema que aflige profissionais de todas as áreas. Não só em Bagé. Aqui, no entanto, sei de professores que passam o dia inteiro postando no Facebook e fico me perguntando como eles fazem para preparar as aulas. Ou darão aulas através das redes sociais. Aulas de comportamento: faça isso, não faça aquilo. Ou aulas de amor e ódio: fulano é mau, beltrano é ruim. Ou aulas de civilidade: bom dia, boa noite, já volto, até amanhã... 

    Não só os professores. O único perigo que oferecem é o de matar a cultura. Médicos podem matar pessoas por ação ou omissão, como aconteceu em Candiota. E fica tudo por isso mesmo. Este é um país que vai pra frente somente quando desfilam as escolas de samba.

Um comentário:

  1. Ótima matéria sobre os médicos cubanos e a hostilidade dos médicos brasileiros em relação aos mesmos. É compreensivel, pois a mentalidade dos primeiros os surpreende e assusta. Parabéns!

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