O
PT vem defendendo a tese de que o golpe é obra de duas ou três pessoas que
teriam tanto poder de persuasão e barganha a ponto de convencerem dois terços
da Câmara dos Deputados e mais da metade dos senadores, além de juízes,
promotores e outros que tais, incluindo Maçonaria, Lyons, Rotary, clubes de
mães, clubes de pais, clubes de filhos e clubes de babás, acrescentando-se a
estas as babás formadas pelos guardiães da Constituição, também apelidados de
ministros do Supremo Tribunal Federal, de que o golpe era necessário, muito
necessário e que deveria ser feito de maneira branda, muito branda, através de votações
no Congresso Nacional para que Dilma fosse afastada, dando lugar a um governo
deles, somente deles, os donos do Brasil.
É
uma tese minimalista e, por si mesma, fraca, fraquíssima, tão fraca que não
convence nem o próprio Clube dos Golpistas e somente é aceita pelos ansiosos
por encontrar em determinadas pessoas o necessário alvo para escracho e
vitupério, como se tudo se resumisse a desacordos entre Dilma e seus antigos
aliados da direita, razão pela qual energúmenos como Cunha, Renan, Temer e
similares resolveram congregar todas as forças do Mal e dar o golpe. Por birra,
capricho, pirraça.
Getúlio
Vargas denunciou em sua carta-testamento: (...) “A campanha subterrânea dos grupos
internacionais aliou-se à dos grupos nacionais revoltados contra o regime de
garantia do trabalho. A lei de lucros extraordinários foi detida no Congresso.
Contra a justiça da revisão do salário mínimo se desencadearam os ódios” (...).
Dilma,
Lula e o PT disseram que a culpa é do Eduardo Cunha, do Temer e de mais um
pequeno grupo de conspiradores. No entanto, as causas do golpe tentado em 1954
não diferem em nada do golpe de 2016.
Jânio
Quadros, em sete meses de governo, restabeleceu as relações diplomáticas com a
União Soviética e a China, condenou a invasão da Baía dos Porcos pelos Estados
Unidos, em Cuba, nomeou o primeiro embaixador negro da história do Brasil,
condecorou Che Guevara com a Ordem do Cruzeiro do Sul, criou a reserva indígena
do Parque Nacional do Xingu, defendeu a política de autodeterminação dos povos,
acabou com os subsídios ao câmbio que beneficiavam - à custa do erário público
- grupos econômicos importadores, abriu centenas de inquéritos e sindicâncias,
em combate aberto contra a corrupção.
No
dia 21 de agosto de 1961 nacionalizou as jazidas de ferro de Minas Gerais, em
prejuízo da empresa norte-americana Hanna.
No dia 25 foi obrigado à renúncia pelos militares. Por trás dos militares
estavam Júlio de Mesquita Filho, Roberto Marinho e Carlos Lacerda. Por trás
desses três entreguistas estavam as multinacionais e o governo dos Estados
Unidos. Um trecho da sua carta de renúncia: (...) “Desejei um Brasil para os
brasileiros, afrontando, nesse sonho, a corrupção, a mentira e a covardia que
subordinam os interesses gerais aos apetites e às ambições de grupos ou
indivíduos, inclusive, do exterior” (...).
Dilma,
Lula e o PT disseram que a culpa é do Eduardo Cunha, do Temer e de mais um
pequeno grupo de conspiradores. No entanto, as causas do golpe tentado em 1961
não diferem em nada do golpe de 2016.
João
Goulart anunciou a realização da reforma agrária, reforma urbana, reforma
educacional, reforma fiscal e reforma eleitoral. As reformas, que incluíam a
nacionalização de vários setores industriais, foram bloqueadas no Congresso. No
dia 13 de março de 1964, no comício da Central do Brasil, que reuniu cerca de
150.000 pessoas, João Goulart denunciou a oposição, dizendo que ela estava a
serviço das grandes companhias internacionais e contra o povo. No dia 31 de
março teve início o golpe militar, resultando numa ditadura que durou mais de
20 anos. Por trás do golpe militar estavam os grandes financistas
internacionais e as oligarquias brasileiras. O golpe teve o apoio dos Estados
unidos, que enviou a sua Sexta Frota para águas brasileiras.
Dilma,
Lula e o PT disseram que a culpa é do Eduardo Cunha, do Temer e de mais um
pequeno grupo de conspiradores. No entanto, as causas do golpe concretizado em
1964 não diferem em nada do golpe de 2016.
A
principal dessemelhança com as tentativas de golpe em 1954 e 1961 e com o golpe
militar de 1964 é que, ao contrário dos governos de Getúlio Vargas, Jânio
Quadros e João Goulart, o governo petista derrubado provisoriamente não pode
ser caracterizado como claramente nacionalista ou, mesmo, revolucionário. As
grandes conquistas sociais do PT foram o programa Bolsa Família e o programa
Minha Casa, Minha Vida. E, assim mesmo, a pau e corda, abaixo de alianças com a
direita no Congresso Nacional.
Um
toma-lá-dá-cá que resultou no fim da reforma agrária, no fim da sempre falada e
jamais tentada reforma urbana, em um programa agrário que somente beneficia o
latifúndio, no apoio às oligarquias nacionais e empresas multinacionais, na
despolitização do operariado, devido ao atrelamento da CUT e de outras centrais
sindicais ao PT, no endividamento com os bancos estrangeiros, que compraram ao
FMI a dívida externa, na dependência externa em tecnologia, na aceitação do
papel de um país meramente agrário e exportador, na adoção de uma política
educacional desmotivadora e alienante, no ajuste fiscal para pagar os bancos
internacionais, na lei antiterror contra os movimentos sociais e nas suspeitas
alianças com os Estados Unidos e demais países imperialistas.
E,
apesar de tudo isso, o golpe. Apesar do triste jogo das alianças com a direita
em nome de uma governabilidade absolutamente aparente, entregue a ministros de
partidos com tendências ideológicas diversas e opostas e na qual Dilma fez o
papel de rainha da Inglaterra. Em nenhum momento Lula ou Dilma tiveram a
coragem de governar para os trabalhadores.
Ao
contrário de João Goulart, que denunciou a oposição entreguista, Lula e Dilma
aliaram-se à oposição lesa-pátria. Diferente de Jânio Quadros, que acreditava
que o Presidente da República seria respeitado em suas decisões, Lula e Dilma
temeram a reação da direita e uniram-se a caciques corruptos como José Sarney e
Paulo Maluf. Longe, muito longe do governo nacionalista de Getúlio Vargas, que
preferiu o suicídio para evitar um golpe militar que entregaria o país aos
Estados Unidos, Lula e Dilma foram ao encontro dos traidores e foram por eles
traídos.
A
falta de conhecimento político, das leis que regem o movimento da sociedade, a
ausência de profundidade, o tratamento da política através de um pueril
pragmatismo, o assistencialismo como meta e não como meio, políticas sociais
que defendem minorias, mas que não alavancam o progresso da maioria, tudo isso
agregado à aliança com partidos reacionários fez do governo petista, desde o primeiro
dia do primeiro mandato de Lula, um aglomerado de indecisões que somente
favoreceram os planos da direita.
Então,
por que o golpe? Por ódio à Dilma e ao Lula e para acabar com o PT, um partido
de centro (centro-esquerda ou centro-direita, como preferirem) que serve como
amortecedor para a luta de classes? Assim como outros partidos centristas, o PT
agrega setores da população que poderiam ficar à deriva ou entrar para partidos
marxistas. Provocar a extinção do PT seria um erro estratégico, dando espaço a
partidos não tão confiáveis para os que se consideram donos do país e fazem das
eleições uma panacéia para as massas iludidas. Para a direita, o PT é um
partido útil e necessário, evitando revoltas no campo e freando o movimento
sindical - além de passar um “ar” de esquerda light tão agradável para a classe média da geração celular e
Facebook, que se compraz em fazer diárias revoluções virtuais.
VENEZUELA
É O ALVO
O
golpe tem outras causas e a principal delas é a situação internacional. Assim
como nos anos ’60 e ’70, a guerra fria voltou com toda a intensidade e tudo
indica que, em breve, se tornará muito quente. E não se trata apenas da guerra
contra os terroristas no Iraque, Síria e Líbia. Aquilo é um ensaio. Observem a
situação internacional, com a China sendo ameaçada no seu próprio mar por
forças norte-americanas e com a Rússia cercada em todas as suas fronteiras pela
OTAN. É uma declaração de guerra, só falta começar o tiroteio. E não esperem
que, desta vez, a Rússia vá se render antecipadamente. Putin não é Gorbachev.
A
todas essas, os Estados Unidos desejam assegurar-se do que consideram o seu
quintal: a América Latina. Na Argentina, muito dinheiro foi investido para
eleger Maurício Macri, que já planeja instalar bases norte-americanas no país.
No Brasil, não foi diferente, mas Aécio perdeu as eleições e o golpe de Estado
tornou-se obrigatório.
O
golpe foi organizado dentro do Instituto Millenium, filial oficiosa do USAID
norte-americano e que congrega as forças mais reacionárias do Brasil, com o
apoio dos Estados Unidos, através da embaixadora Liliana Ayalde, a mesma que
organizou o golpe no Paraguai, em 2012, e em Honduras, em 2008. E no mesmo
estilo daqueles dois golpes anteriores – impedimento do(a) Presidente, votado
nos Parlamentos, sem prova de qualquer crime. Sabe-se que em Honduras e no
Paraguai foram “investidos” milhões de dólares para convencerem os
parlamentares. No Brasil não deve ter sido diferente.
A
operação Lava Jato serve de cortina de fumaça para o golpe e para acostumar o povo
a um Estado policial. Assim como em 1964, a desculpa é o combate à corrupção.
Sérgio Moro é um juiz que serve aos interesses da direita, assim como a maioria
do STF, e será descartado na hora certa, quando começar a se tornar incômodo,
como aconteceu com Eduardo Cunha.
O
impedimento de Dilma não é igual ao impedimento de Collor, ao qual sucedeu o
tranqüilo Itamar Franco. Temer tem pressa em executar planos fascistas porque
sabe que poderá sair assim que completar o estrago. A tendência natural é Dilma
voltar ao governo, mas só depois de muitas alianças em segredo dentro do Senado
e só depois do “governo” de Temer concluir adequadamente o serviço para o qual
foi contratado. Daí a afobação. São duas as missões de Temer. A primeira
consiste em promover todas as piores mudanças contra a nação e entregar o país
ao capital estrangeiro. Ao mesmo tempo, deve ajudar o império a liquidar de vez
com a Venezuela, Equador e Bolívia – últimos países com governos nacionalistas
na América do Sul.
Um
verdadeiro golpe de Estado nunca descarta as Forças Armadas. Às vezes, como em
1964, elas dão o golpe ostensivamente; outras vezes permanecem nos quartéis até
serem chamadas. E já foi anunciado o chamamento. Sob a desculpa da realização
das Olimpíadas do Rio de Janeiro, em agosto, Temer anunciou que vai mobilizar
cerca de 30.000 efetivos para guardar as fronteiras. Sem contar a Polícia
Federal e todas as demais polícias, ABIN e provável ajuda dos serviços secretos
dos sócios do norte das Américas. Ao mesmo tempo, 12 bilhões serão destinados
para a reestruturação das Forças Armadas.
E
o Brasil faz fronteira com a Venezuela. Recentemente, Nicolás Maduro mobilizou
cerca de 500.000 efetivos das três armas face à iminente ameaça de ataque dos
Estados Unidos e aliados. Muito provavelmente, devido ao vazamento do documento
“Operação Venezuela – Freedom 2”, do Comando Sul dos Estados Unidos. Ali está
detalhada a estratégia utilizada para derrubar o governo venezuelano, incluindo
o ataque militar que será iniciado através de bases dos Estados Unidos na
Colômbia, após autorização da ONU, assim como fizeram na Líbia de Khadafi. Não
por acaso o embaixador da Venezuela ainda não apresentou as suas credenciais ao
“governo” Temer.
Talvez
as Forças Armadas brasileiras se limitem a fechar as fronteiras, mas não é
improvável que desejem se exercitar, participando da guerra anunciada, que
somente acontecerá se a planejada guerra civil na Venezuela não der certo. O
prêmio será parte do petróleo venezuelano e uma grande ascendência geopolítica
sobre a região do Caribe.
Não
é coincidência que a embaixadora Liliana Ayalde esteja saindo do Brasil por
estes dias, com a missão golpista cumprida, para dar lugar a Peter Michael
Mckinley, que é filho de pais norte-americanos, mas nascido na Venezuela. O
novo embaixador é pós-graduado em Estudos Latinos Americanos pela Universidade
de Oxford e autor do livro “Caracas Pré-Revolucionária: Política, Economia e
Sociedade”.
Se
Dilma voltar, será obrigada a aceitar as reformas de Temer, e a única razão para
a aceitação do seu retorno ao governo através do Senado será a paralisação das
manifestações populares, ou uma não improvável chamada a novas eleições com
cartas marcadas, que elegeriam outro fascista do mesmo grupo que governa agora,
como Aécio Neves. Mas é mais provável que Dilma seja deposta pelo Gilmar
Mendes, depois de perder a votação no Senado. E não devido às nefastas
influências de Cunha, Temer, Calheiros ou Fernando Henrique, mas por uma
questão de segurança nacional dos Estados Unidos, os verdadeiros donos do
Brasil desde a morte de Getúlio Vargas.
Ótima matéria! Coerente na análise do que se passa atualmente em nosso país. Parabéns!
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